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Análise Psicológica

versão impressa ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica v.17 n.3 Lisboa set. 1999

 

A esmeralda perdida: a informação ao doente com cancro da mama (1997) - Maria do Rosário Dias. Lisboa: ISPA, Estudos 5.

 

No panorama da saúde em Portugal este livro não poderia ter sido publicado em melhor altura, uma vez que as questões da informação em saúde não só são geralmente pouco investigadas entre nós, como se constituem como uma dimensão fundamental no âmbito da promoção da qualidade dos cuidados de saúde que são prestados. Os programas de melhoria de qualidade em saúde, quer relacionados com a qualidade dos serviços quer com a qualidade dos cuidados começam a ter importância crescente nos serviços de saúde portugueses. Finalmente, dimensões psicológicas (tais como, por exemplo, os comportamentos de adesão a exames de rastreio e os processos de confronto e adaptação à doença) associadas às mais frequentes doenças cancerosas da Mulher estão a ser cada vez mais investigadas em diferentes países.

A transmissão de informação em saúde é, portanto, uma questão de grande actualidade e, ao mesmo tempo, assume particular relevância e significado nas doenças cancerosas, colocando com frequência dilemas éticos à consciência profissional dos técnicos de saúde, aspectos que ainda acentuam mais a importância deste trabalho agora publicado a propósito da informação em contexto hospitalar à doente com cancro da mama.

A autora, psicóloga clínica e psicoterapeuta, apresenta neste livro o trabalho de investigação que constituiu a sua dissertação de Mestrado em Ciências da Educação e que se divide em duas partes.

Na primeira parte revê questões históricas e teóricas relacionadas com a informação ao doente com cancro, apresenta o referencial teórico que orientou o seu estudo, bem como a metodologia de investigação que desenvolveu.

Assim, o primeiro capítulo desta parte é dedicado a uma revisão da história e da evolução das políticas de informação ao doente oncológico, com destaque para as tendências actuais desenvolvidas em diferentes países. São revistos estudos fundamentais realizados neste âmbito, o que dá ao leitor a possibilidade de se inteirar de forma praticamente completa sobre os antecedentes e a situação actual da problemática em estudo.

No segundo capítulo desta primeira parte a autora desenvolve o referencial teórico do seu estudo, que se situa no campo sociológico, delimita o problema sobre o qual incidiu o seu estudo e formula as questões a investigar. Termina com a apresentação detalhada da metodologia de investigação que adoptou.

Na segunda parte, apresenta e discute os resultados, enquadrando-os ao longo da cadeia processual médica em contexto hospitalar e estudando o seu impacto no sujeito doente.

A pesquisa implicou uma análise longitudinal da questão da informação ao longo da cadeia processual médica associada ao modo como os cuidados estão organizados no contexto hospitalar específico onde o estudo foi realizado. Essa análise longitudinal definiu 3 sub-unidades sociais que correspondem a três capítulos.

Deste modo, no primeiro capítulo desta parte incide sobre a caracterização sociológica da estrutura técnica e social daquela cadeia, com referência especial à organização dos espaços físicos e ao modelo de produção de cuidados médicos.

No segundo capítulo aborda os processos de negociação entre os intervenientes em diferentes fases da cadeia processual médica a propósito da informação prestada às mulheres com cancro da mama e analisa os processo informais que emergem aos lado da comunicação formal.

Finalmente, no terceiro capítulo, a que se seguem as conclusões do estudo, procura identificar traços de perfis psicossociológicos que caracterizam as categorias de «doente informado» e de «doente desinformado». Este aspecto da investigação representa um resultado muito interessante e original deste estudo, que tal como a autora refere, sugere a necessidade de um aprofundamento da caracterização dessas categorias de doentes.

Este trabalho valioso da Drª Maria do Rosário Dias, quer pelo referencial teórico que optou para enquadrar a sua investigação, quer pela metodologia de investigação e orientação escolhidas é uma investigação de índole sociológica (no quadro do que habitualmente se entende por sociologia da saúde), não é uma investigação em psicologia da saúde, embora os seus resultados interessem inequivocamente a quem se movimenta no quadro da intervenção da psicologia clínica em contextos hospitalares que lidem com cancro da mama nas mulheres. Porém, isto não retira alguma ambiguidade que, a meu ver, resulta directamente de um campo dito psicossociológico cuja relação precisa com a Psicologia e com a Sociologia é frequentemente nebuloso.

Uma abordagem multidisciplinar exigiria a valorização desses resultados no âmbito de dimensões psicológicos individuais, designadamente características individuais das estratégias de confronto usadas pelos sujeitos para lidarem com a doença, a fase do processo de adaptação psicológica à doença e ao seu tratamento em que se encontrem, o tipo de estratégias de influência usadas pelos médicos nos seus comportamentos prescritores, o grau de satisfação dos sujeitos em relação aos cuidados de saúde que lhes são prestados e, em particular, a satisfação com a informação que recebem sobre a sua doença e o seu tratamento por parte dos técnicos de saúde, aspecto que, como se sabe, aparece frequentemente relacionado com o próprio estado de saúde e com os comportamentos de adesão. De resto, é bem sabido como os conhecimentos de sociologia da saúde podem ser relevantes para enquadrar a compreensão psicológica dos processos de informação e comunicação em saúde, em particular quando estão em jogo doenças percepcionadas como ameaçadoras.

Este trabalho deixa, portanto, vários resultados de grande interesse e, ao mesmo tempo, uma abertura significativa para a colocação de várias questões a investigar ulteriormente no plano psicológico.

Na área específica das problemáticas associadas ao cancro da mama, este livro é praticamente de leitura obrigatória para os técnicos de saúde em geral e, particularmente, para quem se interessa pela investigação focalizada na informação em saúde, quer do ponto de vista sociológico quer psicológico.

José A. Carvalho Teixeira

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